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Rotativo suspenso a partir de segunda
Por Livia Rangel
Publicado em 9 de janeiro de 2016 às 13:45
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Uma semana depois do início da cobrança, o estacionamento rotativo em Guarapari está suspenso a partir desta segunda (11). A decisão é do juiz Marcelo Matar Coutinho, da Vara da Fazenda Pública de Guarapari que acatou requerimento da Associação dos Comerciantes de Guarapari e emitiu o veredito na tarde desta sexta-feira (08).
Caso Prefeitura e a empresa concessionária do serviço, a Vista Group Network – VGN, insistam na cobrança, será aplicada uma multa de R$ 15 mil por dia. Na primeira liminar solicitada pela Associação, no ano passado, o valor da multa era de R$ 5 mil.
Desde o seu primeiro anúncio, o rotativo vem sendo alvo de muitas críticas e polêmicas entre a população, que reclama da falta de transparência do poder público ao implantar o sistema. Por exemplo, não foi realizada nenhuma consulta ou audiência pública para definir o parâmetro das cobranças.
Confira a decisão abaixo na íntegra. Em breve, o Folha da Cidade trará uma reportagem mais detalhada sobre o assunto.
GUARAPARI – VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL, MUNICIPAL, REGISTROS PÚBLICOS E MEIO AMBIENTE
Número do Processo: 0007080-31.2015.8.08.0021
Requerente: ASSOCIACAO DOS COMERCIANTES DE GUARAPARI
Requerido: VISTA GROUP NETWOORK SISTEMAS E MEPREENDIMENTOS LTDA, MUNICIPIO DE GUARAPARI
DECISÃO
Trata-se de NOVO PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO formulado pelo Município de Guarapari em relação à decisão proferida por este juízo, em 10/07/2015, que DEFERIU o pedido de liminar, “para suspender de imediato toda e qualquer atividade relacionada à instalação/execução do serviço de estacionamento rotativo no Município de Guarapari, objeto da concorrência pública nº 0013/2014”, sob pena de multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), imposta solidariamente ao Município Réu, ao gestor público responsável pela regulamentação da lei autorizadora da referida concorrência e pela adjudicação da concessão do serviço, bem como à Pessoa Jurídica vencedora do certame (Vista Group Network Sistemas e Empreendimentos Ltda).
Digo “NOVO” porque o Município de Guarapari, em 10/12/2015, apresentou pedido de reconsideração fulcrado na efetivação da municipalização do trânsito, bem como na decisão de revogação da suspensão do contrato administrativo exarada pelo Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, que tratou da capacidade técnica da empresa vencedora do certame.
Este juízo, em 17/12/2015, manteve a decisão primeva, cujo inteiro teor trago à colação:
“Trata-se de ação civil pública proposta pela ASSOCIAÇÃO DOS COMERCIANTES DE GUARAPARI em face do MUNICÍPIO DE GUARAPARI, da CÂMARA MUNICIPAL DE GUARAPARI (esta excluída da lide pela decisão de fls. 130/134) e VISTA GROUP NETWOORK SISTEMAS E EMPREENDIMENTOS LTDA, partes qualificadas nos autos.
Em apertada síntese, a Associação Autora afirma que a concorrência pública referente à concessão do serviço de estacionamento público rotativo no Município de Guarapari padece de nulidade em razão de:
(i) a lei que autorizou sua realização apresentar vício de iniciativa (inconstitucionalidade formal);
(ii) não estar o Município de Guarapari formalmente integrado ao Sistema Nacional de Trânsito – STI, o que o impediria de implantar referido estacionamento e redundaria em ofensa ao Código de Trânsito Brasileiro;
(iii) ter havido ilegalidade na não habilitação da concorrente que a princípio vencera o certame.
Atribui o caráter de fumus boni juris às alegações acima. À guisa de periculum in mora, menciona o risco de se manter a terceira Requerida como outorgada e as cobranças tidas por ilegais a serem feitas pelos Réus em relação aos usuários das vias de trânsito incluídas no projeto, “bem assim na possibilidade de expedição indevida de autuações e notificações por pessoas sem poder para tanto”.
A decisão de fls. 130/134 deferiu a medida liminar para “suspender de imediato toda e qualquer atividade relacionada à instalação/execução do serviço de estacionamento rotativo no Município de Guarapari, objeto da concorrência pública 0013/2014, o que faço sob cominação de multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) imposta solidariamente ao Município Réu, ao(s) gestor(es) público(s) responsáveis pela regulamentação da lei autorizadora da referida concorrência e pela adjudicação da concessão do serviço, bem como à Pessoa Jurídica vencedora do certame (Terceira Requerida)”.
Às fls. 206/225, o primeiro requerido pede a reconsideração da decisão que concedeu a medida liminar, ao fundamento de que (i) a municipalidade efetivou a municipalização do trânsito e teve aprovado convênio com o Detran/ES para todos os atos de fiscalização e controle, bem como de que (ii) houve a revogação, pelo TCEES, da medida cautelar de suspensão da implantação do serviço materializada na Decisão TC – 4134/2015, ante o reconhecimento da capacidade técnica da empresa vencedora (terceira requerida).
Às fls. 228/235 consta manifestação do Ministério Público, entendendo pela perda de objeto com relação ao pedido de reconhecimento da ilegalidade da implantação do serviço fundado (i) na ausência de integração da municipalidade ao Sistema Nacional de Trânsito (fls. 193) e (ii) na incapacidade técnica da terceira requerida (fls. 220/225), e pela procedência parcial do pedido em relação à inconstitucionalidade da emenda legislativa de autoria do Vereador Sergio Ramos Machado (artigo 2º, § 2º, letra a) ao projeto originado do Prefeito Municipal de Guarapari.
A associação autora, às fls. 236/248, defende a manutenção da medida liminar.
O primeiro requerido colacionou, às fls. 253/311, cópia do termo de edital de concorrência pública de nº 013/2014, cujo objeto é a outorga da concessão da exploração do serviço público de estacionamento rotativo no âmbito do Município de Guarapari, reiterando o pedido de reconsideração da liminar que suspende a implantação do sistema.
É o relato do necessário. Decido.
Impõe-se, no presente momento, a apreciação do pedido de reconsideração da liminar que suspendeu a instalação/execução do serviço de estacionamento rotativo no Município de Guarapari, objeto da concorrência pública 0013/2014.
Neste particular, a despeito dos novos elementos de convicção colacionados aos autos, os quais evidenciam a integração do Município de Guarapari ao Sistema Nacional deTrânsito, segundo estabelecido na Resolução CONTRAN nº 296/2008 (fls. 191/193), e a revogação pelo TCEES de pregressa medida cautelar de suspensão da implantação do serviço do estacionamento rotativo com fundamento no reconhecimento da capacidade técnica da terceira requerida (empresa vencedora da concorrência), tenho que ainda remanesce, com força suficiente à sustentação da liminar, as questões relacionadas aos vícios de inconstitucionalidade formal (de iniciativa) do projeto de lei original (nº 237/2013), de autoria do Vereador Sérgio Ramos Machado, convertido na Lei nº 3.704/2014, bem como da emenda parlamentar modificativa nº 01/2014, que implicou aumento de despesa no projeto de lei nº 246/2014, de iniciativa do Prefeito Municipal, convertido na Lei nº 3.807/2014.
Quanto ao primeiro ponto, importa salientar que não há controvérsia nos autos acerca do vício de inconstitucionalidade formal da Lei nº 3.704/2014, deflagrada pelo Parlamento Municipal em matéria de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo logal.
Com efeito, o serviço de estacionamento rotativo em vias públicas, em que pese sua delegação mediante concessão a ente privado que se incumbe da administração direta do bem, constitui serviço público que somente pode ter seus parâmetros definidos por lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo. Desse modo, cabe ao Prefeito Municipal deflagrar o processo legislativo e, a posteriori, regulamentar a lei correspondente.
Na verdade, a norma impugnada possui caráter regulamentar, pois trata ato administrativo propriamente dito, aspecto procedimental concernente à exploração de bem municipal. Assim, tem-se por também malferido o art. 84, VI, a, da Carta Política, que determina ser da competência privativa do Chefe do Executivo os atos relativos à organização e ao funcionamento da Administração Pública.
Desse modo, a iniciativa parlamentar de lei que versa sobre serviços públicos denota ingerência do Poder Legislativo no âmbito de atuação reservado ao Poder Executivo, constituindo ofensa ao princípio constitucional da reserva da administração, corolário da separação de poderes, notadamente quando, como no caso presente, vem a ser promulgada pelo Presidente da Câmara Municipal em vista da derrubada de veto expresso do Prefeito, fundado na reportada mácula.
A tese da convalidação da implantação do sistema rotativo defendida pela municipalidade escorada em suposta sucessão de leis, a seu turno, não traduz modificação do panorama ensejador da concessão da liminar, porquanto, na realidade, o que se tem evidenciado nos autos (fls. 84/93), seja pelo conteúdo, seja pela própria ementa, é que o projeto de lei nº 246/2014, de autoria do Prefeito Municipal de Guarapari, posteriormente convertido na Lei nº 3.807/2014, não traduz trato autônomo da matéria, tendo, na realidade, se limitado a alterar dispositivos da pregressa e maculada normatização municipal, tanto que o próprio decreto regulamentador da matéria reporta-se à Lei nº 3.704/2014 (fls. 94/98).
Nessa esteira, importa realçar que, da mesma forma que eventual sanção da lei municipal pelo Chefe do Executivo não é suficiente para convalidar o vício formal de iniciativa1, também a pontual inserção de alteração de dispositivos na lei viciada por normatização de iniciativa do primeiro a tanto não se vocaciona. Não importa, para efeito de preservação do modelo estruturador do processo legislativo, tal como delineado em seus aspectos fundamentais pela Constituição da República, e imposto, enquanto padrão normativo de compulsório atendimento, à observância incondicional dos demais entes federativos, que a ulterior aquiescência do Chefe do Poder Executivo venha condensada por meio de sanção do projeto de lei, ou posterior adesão por meio de projeto de lei de sua iniciativa que se restrinja a promover alterações pontuais na lei oriunda do primeiro. Ainda aqui, nesta última hipótese, estar-se-á diante da usurpação do poder de instauração do processo legislativo em matéria de iniciativa constitucionalmente reservada, mantida a inaugural transgressão ao texto da Constituição da República e, em conseqüência, a inconstitucionalidade formal da lei assim editada.
Mantém-se, ainda, como já ressaltado na decisão de fls. 130/134, “a possibilidade de a emenda modificativa n. 01/2014 ao projeto de lei n. 246/2014 (doc. fls. 89) acabar gerando perda de receita do Ente Público e, assim, reflexamente, aumento do custeio do serviço concedido. É que a referida emenda, de iniciativa legislativa, ao alterar o disposto no art. 2º, §2º, a, do projeto de lei oriundo do Executivo (PL 246/2014), acabou por triplicar o tempo de estacionamento tolerado a veículos em áreas sinalizadas próximas a Hospitais, Farmácias e Drogarias. O presumível intento da modificação (que, suponho, tenha sido o de facilitar o acesso de automóveis aos referidos estabelecimentos), conquanto elogiável, implicaria à primeira vista perda ou diminuição das receitas públicas obteníveis com a implantação do sistema, precisamente ao multiplicar de 05 (cinco) para 15 (quinze) minutos o período de tolerância originalmente previsto. É intuitivo que a arrecadação – que derivaria de multas e infrações por descumprimento das condições de uso das vagas públicas – tende a diminuir com o aumento do período de tolerância. Se a arrecadação tende a diminuir, a não ser que a emenda modificativa preveja algum tipo de contrapartida financeira ao aumento da tolerância (o que, todavia, não faz), por via oblíqua acaba aumentando para o Erário Municipal os custos de implantação do serviço concedido, afigurando-se, ao menos nessa medida, de duvidosa constitucionalidade”.
Por todas essas razões (aparentes traços de inconstitucionalidades na lei autorizadora da concorrência pública), reputo ainda suficientemente delineado o requisito do fumus boni juris a justificar a manutenção da liminar.
Na mesma linha, emerge intacto o requisito do periculum in mora, uma vez que, conforme ressaltado na decisão de fls. 130/134, “se o avanço da cognição – uma vez estabelecido o contraditório e devidamente instruído o feito – acabar por confirmar as suspeitas iniciais de inconstitucionalidade, a consumação da adjudicação do contrato e suas presumíveis consequências (e.g. implantação dos parquímetros, contratação de agentes fiscais, edificação de sedes ou escritórios etc.) podem acarretar não apenas prejuízo financeiro à Concessionárioa e ao Poder Concedente como ofensa aos ditames da legislação federal de trânsito e às exigências por ela impostas à implantação de referidos sitemas no âmbito municipal. Tais riscos, em si mesmos ponderáveis, crescem de tomo ao se projetarem dificuldades e obstáculos que possivelmente se imporiam a uma reversão do cenário, uma vez implantado e posto em funcionamento todo o sistema”.
Indefiro, portanto, o pedido de reconsideração.
Intimem-se as partes e o Ministério Público para que informem se desejam a produção de outras provas, justificando-as e especificando-as em caso positivo, no prazo de 10 (dez) dias, sob a expressa advertência de que o silêncio será interpretado como concordância com o julgamento imediato da lide.
A terceira requerida e o Parquet deverão ser intimados também para ciência dos documentos juntados às fls. 253/311 pelo primeiro requerido.
Após, retornem conclusos. Diligencie-se.”
Após referida decisão, como já dito, o Município, em 07/01/2015, apresenta novo pedido de reconsideração, alegando que, na verdade, a lei que regulamenta o sistema de estacionamento rotativo é muito anterior às Leis Municipais 3.704/2014 e 3.807/2014, pois que datada de 07/01/1997 (Lei nº 1.625/1997), de iniciativa do Chefe do Poder Executivo Municipal à época, Paulo Sérgio Borges, ainda “em vigor”, já que jamais fora revogada.
Salienta, ainda, que a referida Lei 1.625/1997 foi expressamente convalidada pela Lei nº 3.984/2015, também de iniciativa do Chefe do Poder Executivo Municipal em atividade, Orly Gomes da Silva.
Desta forma, alega a inexistência de qualquer vício de iniciativa atinente à legislação regulamentadora dos sistema de estacionamento rotativo, pois que, tanto a Lei anterior (Lei nº 1.625/1997) quanto à Lei atual (nº 3.984/2015), são de iniciativa do Chefe do Poder Executivo Municipal.
Pois bem, após esta necessária introdução, passo a analisar a reiteração do pedido de reconsideração.
Analisando detidamente seus fundamentos, entendo que os mesmos não prosperam.
Primordialmente, cabe registrar que a simples superveniência de nova legislação, escoimada do vício formal de iniciativa, versando sobre autorização para a concessão pelo Executivo do serviço de exploração de estacionamento rotativo nos logradouros públicos não possui o condão de eliminar, de per si, a ilegalidade ou irregularidade da concorrência pública que constitui o objeto da ACP.
Primeiro, porque não traduz a inconstitucionalidade formal da Lei nº 3.704/2014 o único fundamento passível de acarretar o reconhecimento da nulidade da licitação, valendo assentar, por exemplo, a necessidade de enfrentamento, no plano meritório, em sede de cognição exauriente, de vício consistente na ausência de realização, pelo Executivo, da audiência pública exigida no art. 39, caput, da Lei de Licitações
Segundo, porque, de acordo com a melhor doutrina, a referência do art. 175 da CF/88 à edição de lei para delegação de serviço público exige a precedência da autorização legislativa em relação ao desencadeamento da licitação pelo Executivo, de modo que, em princípio, nesta cognição ainda não exauriente, não se afigura viável o argumento fundado na possibilidade de ratificação posterior dos atos administrativos com efeito retroativo, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade.
Registre-se, ainda, que a alegação de existência de legislação anterior (Lei nº 1.625/1997) também não merece guarida, já que a mesma já foi superada pelas sucessivas legislações que trataram integralmente sobre o tema, de modo que a licitação, e os atos administrativos que lhe integram, buscaram fundamento de validade na Lei nº 3.704/2014 (hoje, inclusive, já revogada pela Lei nº 3.984/2015).
E, ao contrário do que alega o Município de Guarapari em seu último pedido de reconsideração, a lei nº 1.625/1997 não foi convalidada pela Lei nº 3.984/2015. Ao revés, foi expressamente revogada, embora, no meu sentir, já tenha sido revogada tacitamente pela Lei 3.704/2014 que, repito, tratou integralmente sobre o tema estacionamento rotativo.
Não vejo, assim, novamente, motivos para a revogação da decisão proferida por este juízo, que sequer fora desafiada pelo competente recurso no momento oportuno.
INDEFIRO, assim, o NOVEL PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO.
Além de analisar o pedido de reconsideração, incluo na presente decisão, questão atinente ao descumprimento da decisão que o Município pretende reconsiderar.
É público e notório, inclusive através dos meios de comunicação, que houve a implementação, em 04/01/2016, do sistema de estacionamento rotativo no Município de Guarapari, ao arrepio da decisão proferida por este juízo desde julho do ano passado.
Não restam dúvidas de que a implementação e a exploração do serviço de estacionamento rotativo representaram clara ofensa à decisão de fls. 130/134, ratificada pela decisão de fls. 313/319, que indeferiu pregresso pedido de reconsideração, porquanto, sem que se tenha verificado qualquer revogação ou modificação em seu conteúdo, os requeridos, de forma deliberada e desrespeitosa com a autoridade e imagem do Poder Judiciário no âmbito local, descumpriram a ordem que, em acolhimento ao pleito liminar formulado na presente demanda coletiva, suspendeu “de imediato toda e qualquer atividade relacionada à instalação/execução do serviço de estacionamento rotativo no Município de Guarapari, objeto da concorrência pública 0013/2014”, com cominação “de multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) imposta solidariamente ao Município Réu, ao(s) gestor(es) público(s) responsáveis pela regulamentação da lei autorizadora da referida concorrência e pela adjudicação da concessão do serviço, bem como à Pessoa Jurídica vencedora do certame (Terceira Requerida)”.
Ora, decisão judicial não caduca pelo decurso do tempo, muito menos está sujeita a juízo de valor ou de conveniência da parte destinatária acerca da influência que sobre a mesma possa exercer direito superveniente. Este direito superveniente, na exata medida do que estabelece o art. 462 do CPC, deve ser tomado em consideração pelo juiz, de ofício ou a requerimento, no momento da prolação da sentença, ou mesmo em eventual e oportuno pedido de revogação ou modificação da liminar.
No caso presente, contudo, em nítida caracterização de ato atentatório à dignidade da justiça (CPC, art. 14, V), passível de subsunção à tipologia do art. 11, II, da Lei de Improbidade Administrativa, optaram pelo desleal descumprimento do provimento judicial para somente após socorrerem-se de intempestivo pleito de reconsideração, cujas razões, para maior gravidade da ofensa, não potencializam causa para a revogação da ordem.
Antes de representar uma ofensa ao titular do direito reconhecido no decisum, o deliberado descumprimento da decisão liminar ofende a dignidade da justiça, como valor indispensável à sociedade e inerente ao Estado Democrático. O desprezo, a afronta, o desacato e o desrespeito às decisões judiciais não podem ser tolerados. O não cumprimento de uma ordem judicial emanada de órgão competente e decorrente do devido processo legal, destinada a que o devedor entregue coisa, faça ou deixe de fazer, em obediência ao ordenamento jurídico ou em virtude de obrigação voluntariamente assumida, caracteriza uma ofensa ao poder jurisdicional.
Desta forma, determino o imediato cumprimento da liminar, mediante a suspensão imediata de toda e qualquer atividade relacionada à instalação/execução do serviço de estacionamento rotativo no Município de Guarapari, objeto da concorrência pública 0013/2014.
Sem prejuízo da multa já incidente em face dos agentes envolvidos, cuja cobrança dar-se-á ao final, após o julgamento da demanda, majoro-a para R$ 15.000,00 (quinze mil reais) por dia, já que o valor anterior não foi suficiente para coibir o descumprimento de decisão judicial proferida por este juízo, tudo sem prejuízo de posterior incidência da multa de que trata o artigo 14, do CPC e do encaminhamento de cópia do processo ao MP para avaliação quanto ao cometimento de ato de improbidade administrativa (LIA, art. 11, II).
Desta forma, determino a intimação do Município de Guarapari, Prefeito Municipal de Guarapari e Vista Group Network Sistemas e Empreendimentos Ltda, pessoalmente, POR OFICIAL DE JUSTIÇA PLANTONISTA, para que volte a cumprir, imediatamente, a liminar proferida por este juízo, cessando (de forma imediata) as atividades (exploração de estacionamento rotativo), sob pena de pagamento (de forma solidária, assim como na decisão primeva) da multa diária em valor já majorado, ou seja, R$ 15.000,00 (quinze mil reais).
Por fim, considerando o disposto no artigo 462, do Código de Processo Civil, que trata da ocorrência de fato superveniente apto a influir no julgamento da lide, concedo (em que pesem as revelias das requeridas, cujos efeitos não incidem em relação ao Município de Guarapari) prazo de quinze dias para que todos os participantes do processo (autor e réus) se manifestem acerca da nova legislação (Lei nº 3.984/2015) que trata da matéria objeto da presente demanda, bem como sua repercussão no processo.
Explico: É indubitável que o juiz pode levar em consideração matéria de direito ou de fato, mesmo que não alegada pelas partes. Contudo, em situações como tais é imperioso provocar as partes para se manifestar sobre o ponto que pretende levar em conta.
Neste aspecto, a melhor doutrina, na esteira da compreensão do contraditório na sua faceta substancial, vem entendendo que o juiz deverá previamente ouvir as partes sobre o ponto que, de ofício, pretende levar em consideração.
Na esteira desse pensamento, Fredie Didier Júnior diferencia o “poder agir de ofício” e o “agir sem ouvir as partes”. Nesse sentido, o autor assegura que o juiz pode agir de ofício, inclusive com amparo nos artigos 131 e 462 do CPC, mas antes tem que abrir vistas para a parte se manifestar sobre o ponto considerado relevante. (DIDIER JÚNIOR, 2006, p 59-61).
Desta forma, em homenagem ao princípio do contraditório, intimem-se os participantes do processo para, no prazo comum de quinze dias, se manifestarem sobre a questão acima exposta, bem como se pretendem produzir outras provas.
Decorrido o prazo, retornem os autos conclusos.
Diligencie-se.
GUARAPARI, 08/01/2016
MARCELO MATTAR COUTINHO
Juiz de Direito
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