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Tarefa de julgar
Por Livia Rangel
Publicado em 15 de outubro de 2012 às 00:00
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Uma das grandes necessidades do ser humano é a segurança. Tudo que compromete o sentimento de estar seguro causa mal estar psicológico.
Não é por outra razão que algumas pessoas nunca se contentam com o primeiro parecer médico à face de uma enfermidade. Querem uma segunda e uma terceira opinião e só a unanimidade dos pontos de vista dos clínicos lhes proporciona tranquilidade.
Quando a questão é jurídica a diversidade, que se observa na interpretação das leis, incomoda e perturba: por que motivo dois juízes apresentam soluções opostas à face de um mesmo ponto?
Se a tarefa de julgar consistisse apenas em aplicar ao caso concreto a lei existente, essa operação meramente lógica seria muito simples. Tão simples que seria mais barato substituir os magistrados por computadores.
Segundo Carnelutti, “o legislador tem as insígnias da soberania; mas o juiz possui as suas chaves.”
Outros pensadores do Direito reforçam essa tese:
“O aplicador não se deve encerrar no domínio da rígida lógica formal.” (Alípio Silveira).
“A lei não é sagrada; só o Direito é sagrado.” (Triepel).
“O interesse de manter a segurança jurídica não pode prevalecer sobre o interesse de fazer triunfar a Justiça substancial sobre a Justiça meramente formal.” (Manzini).
“É mais importante o juiz conhecer o homem submetido a seu julgamento do que o conhecer os autos.” (Moura Bittencourt).
Um Apóstolo, e não um jurista, deu um ensinamento a respeito da interpretação das leis de Deus, que é válido também para o mundo das leis humanas: “A letra mata; o espírito vivifica”. (Epístola de Paulo aos Coríntios).
No Espírito Santo, o então Juiz Homero Mafra absolveu dois jovens universitários, acusados de possuir e fumar maconha, embora reconhecendo expressamente a configuração do crime, para manter neles viva a esperança na misericórdia humana.
Toda norma penal contém uma advertência genérica, de disciplina social, que opera pela sua simples existência. Em muitas situações, o simples fato de ser processado é para o acusado uma advertência suficiente, independente de uma efetiva condenação.
O juiz não é mero porta-voz da lei, como pretendeu Montesquieu. Direito é fato social, vivo e palpitante. A lei revela, quando revela, uma das faces do Direito.
Muito mais que um matemático ou um geômetra, o juiz é um artista e um pedagogo.
Um artista, que usa a lei como argila, para construir poemas: poemas de vida, da vida pulsante que geme, chora e sua e que ecoa no pretório.
Pedagogo porque educa, encaminha, aconselha, ama.
Não são apenas petições que vêm aos juízes: são lágrimas, dores, faces, gente como a gente, mais sofrida quase sempre.
João Baptista Herkenhoff, magistrado aposentado, professor universitário e escritor.
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